HELLO STRANGER
this is about truth,beauty,freedom;but above all things,this is about love.

8.1.10

Last kiss

O primeiro beijo sempre pode ser descrito em detalhes.O que se fez quinze minutos antes,a roupa que se vestia,que bebida se bebia,que conversa o antecedeu,a intensidade da luz.Se havia música ao fundo ou apenas o som das ondas a quebrar na praia.Se dedos devotados se entrelaçaram ou se mãos,audazes, se perderam.Quem sabe algum sabor ou simplesmente o paladar inédito de uma boca inexplorada. Talvez,sob o frio da madrugada,respirações trocadas tenham servido de morno alento para os lábios. Mas como é difícil lembrar do último.Ele é o suspiro final.As duas únicas testemunhas que poderiam estar lá,não estavam.Como se um viajante,que não mais voltará,acenasse para aqueles que já olham para o outro lado e que abandonam a estação por caminhos diferentes.Observam o chão,distraídos,enquanto o amor,entre as costas curvadas que se afastam,deixa de respirar.Esse,o último beijo,é um fantasma que assombra pela ausência.Tenta-se lembrar da face pálida,abre-se os olhos na escuridão sem medo do que virá e,no entanto,nada vem. Talvez na lembrança impossível do último beijo estivesse tb a resposta para a pergunta que quer saber onde se errou.Afinal,era amor,era amor,era amor,é certo que era amor.Ainda é, mesmo que ele esteja numa espécie de limbo onde ficam exilados as emoções descartadas pela vida.Talvez esteja lá o último beijo,ladeado por pequenos fracassos mútuos,expectativas abandonadas e frustrações gigantescas.Em uma música o cantor pede para que sua namorada o beije muito,como se fosse a última vez.Chame de amor.Eu chamo de licença poética.Nesse momento,dezenas de amantes dão o último beijo sem saber. Se o soubessem,que intensidade haveria então.Mas já não seria o último beijo.Esta entidade sorrateira,em seu parentesco com a morte,sempre chega sem avisar.Mas,tb nesse momento,dezenas de casais dão o primeiro beijo.E o último,desde esse instante,está a espreita.Então pode ser que os dois,primeiro e último, se fundam.E,como nessas coisas de amor nada é absoluto,há então duas possibilidades.Ou este é o beijo de uma vida - o que se leva nos lábios até o dia em que eles se fechem pela última vez - ou é o que se perde no ar,como as plumas do dente-de-leão,belas mas efêmeras.Na boca,a memória da temperatura exata das respirações que,na fria madrugada,serviram de morno alento para lábios que nunca mais se encontrarão!

(Cracatoa)